RELATÓRIO REFERENTE A UMA PESQUISA FEITA POR PROFESSORES E ESTUDANTES DO ENSINO MEDIO DA ESCOLA CHAGAS MATOS NO ANO DE 2008 NA ALDEIA KULINA NO MUNICIPIO DE ENVIRA/AM

O presente trabalho tem como finalidade expor informações obtidas a partir de uma excursão (pesquisa de campo) feita à aldeia Cacau onde foram investigadas questões relativas à vida dos povos que lá vivem. As atividades desenvolvidas na aldeia reuniram temas acerca da vida cultural, da economia, da religião, vida em sociedade, organização familiar, educação e saúde. O estudo apoiou-se nos pressupostos teóricos que abordam questões sobre os diversos contextos em que se insere a história dos povos indígenas da região – quase sempre através da oralidade – tendo em vista as idéias contidas nos livros didáticos que revelam uma serie de informações inexatas de detalhes exóticos e incompreensíveis, projeções de valores um tanto estranhas.
Esse modo de vê os povos indígenas suscitou o interesse em conhecer melhor a realidade dos povos Kulina da aldeia Cacau. Sendo assim, foram feitas observações seguidas de entrevistas sobre os temas já referidos, pelos alunos do 2º ano do Ensino Médio, acompanhados pela Gestora e pela Coordenadora pedagógica da escola Professor Chagas Mattos, assim como pelos professores de Biologia e de Historia da referida escola e apoiados por um técnico de enfermagem que atua na aldeia e por um missionário alemão de uma ONG que também atua na aldeia.
Para coletar os dados foram utilizadas ferramentas tecnológicas multimídia, assim como para registrar as entrevistas feitas com professor indígena Pereira, que gentilmente nos forneceu muitas informações importantes sobre os fatores da realidade investigada.
Sobre a organização social constatamos que vivem numa sociedade igualitária, ou seja, não existe divisão todos pertencem a mesma classe a terra é coletiva, não existe governo nem patrão. Vivem em comum, não existe propriedade privada. Seus líderes são o Tuxaua que organiza as atividades produtivas e orienta o povo em épocas de conflitos e o Page que cuida dos cerimoniais religiosos, como casamentos e rituais fúnebres e faz as funções de curandeiro.
Quanto a economia, esta se baseia na caça, na pesca, na agricultura, no cultivo de algumas árvores frutíferas, na criação de alguns animais como porco e galinha, na confecção de peças artesanais feitas para vender na cidade mas é de pouca aceitação e na coleta de produtos da natureza. Alguns excedentes agrícolas também são vendidos. No entanto, observou-se que a produção é muito pequena, é feita de forma rudimentar, porem não agridem a natureza nem poluem o ambiente.
A vida cultural expressa seus costumes tradicionais repassados de geração a geração, muito ligados à natureza. Realizam festas culturais tradicionais, como a dança do Mariri, realizada em ocasiões espaciais, produzem a Caiçuma, uma bebida extraída da mandioca e muito usada na ocasião das festas, confeccionam artesanato, enfeite, tinta para adorno, retirada do urucum e de outras plantas da floresta. As crianças desde cedo vão à escola que prioriza a transmissão da cultura e da língua que são considerados aspectos fundamentais para a sua identidade. As cerimônias religiosas e matrimoniais são precedidas pelo Pajé. Quanto a religião observou-se que está ligada a crença no Deus dos cristãos. Realizam rituais fúnebres com canções e danças em adoração ao espírito do morto, mas tem muito medo de alma penada. Existem em suas tradições muitas datas comemorativas e religiosas, as quais são realizadas com grande pompa.
A família é do tipo patriarcal. O pai cuida dos filhos e educa-os conforme suas tradições, no entanto, constatamos que tanto o pai quanto a mãe desenvolvem papeis semelhantes em relação aos filhos. O casamento ocorre entre os 15 e 28 anos das jovens.
Quanto às questões de saúde verificamos que a doença que mais preocupa são as verminoses que atinge todas as faixas etárias, isso devido, principalmente às condições higiênicas, pois ainda não desenvolveram conceitos de higiene que possam ser utilizados como métodos de prevenção a certas doenças entre os povos da aldeia. Outra preocupação são doenças provocadas pelo uso de bebida alcoólica, muito disseminada entre os habitantes da aldeia, onde a violência entre eles cresce assustadoramente, muitos indígenas já apresentam um estado de alcoolismo bem avançado. Essa não é apenas uma preocupação só dos moradores da aldeia, mas também dos habitantes da cidade, PIS índios sobre o efeito do álcool cometem atos de violência também na cidade.
A educação, conforme foi constatado, é bastante, no que se refere a estrutura física da escola, a conservação, aos recursos humanos e matérias de expediente. Quanto aos recursos didáticos – pedagógicos verificou-se que apresentam bom aspecto. O processo de ensino e aprendizagem ocorre em dois idiomas: o Kulina (língua nativa) e o Português. As aulas são dinâmicas, participativas e disciplinares. Os conteúdos são ministrados com a presença e um tradutor, responsável pela transmissão dos conteúdos nos dois idiomas. As indicações do professor entrevistado deixaram transparecer grande preocupação com a questão educacional na aldeia, visto que não existem professores suficientes para atender a demanda local e, também, sobre o espaço físico da escola, o que expressa uma situação de completo abandono em vivem os povos da aldeia Cacau no se refere a questão educacional. Constatamos ainda que alguns indígenas estão incluídos nos programas sociais do governo federal, como auxilio maternidade e bolsa família. Outros recebem aposentadoria pelo INSS. Também foram governo com o Programa Luz para Todos do governo federal. Outro ponto a destacar se refere ao difícil acesso à aldeia por conta das condições da estrada que liga o local à sede do município, pois a aldeia é bastante próxima da cidade.
De acordo com as informações obtidas e com as observações feitas durante a pesquisa de campo podemos inferir que os povos indígenas da aldeia Cacau infelizmente já perderam parte de sua identidade cultural, encontram-se em franco processo de deculturação. Isso por conta da introdução de valores d outra cultura (a do homem branco), dos vagos os conceitos contidos nos livros didáticos e no discurso de vários autores que descaracterizam e discriminam as sociedades indígenas e da visão estereotipada da nossa sociedade que concebem os povos indígenas como algo profundamente indesejável, vistos com seres inferiores e com várias deficiências sociais e culturais. Essa visão expressa uma imagem empalidecida e fantasmagórica.
No entanto, constatamos apenas um povo com cultura diferente e que por isso sofre discriminação. Seus hábitos, costumes, crenças, enfim, seus estoques culturais lhes são peculiares e, portanto, merecem ser respeitados. Estão muito ligados à natureza e expressam uma concepção produtiva e de sociedade diferente do ideário que orienta o sistema capitalista.