4-VIDA CULTURAL: ARTE, FOLCLORE, LENDAS E FESTAS.



4 – 1 ARTE.
            No município de Envira a Arte é uma atividade que vem sendo desenvolvida já há muito tempo, desde o processo de ocupação, antes mesmo da fundação do município. Várias pessoas inclinadas para a atividade artística tiveram um papel importante nas produções artísticas locais. Desenvolveram trabalhos em madeira, barro, cipó, taquara, papel, tecido etc. Nas últimas décadas a Arte tem sido o resultado de um trabalho incansável de artistas dotados de um potencial imensurável, preocupados em retratar as belezas da cidade e entorno: a flora, a fauna, os rios, os lagos, enfim, o homem e a natureza. As produções artísticas também expressam uma forte inspiração de uma mentalidade religiosa. As criatividades dos artistas, que expressam iniludível vocação para o ofício, lhes permitem a criação de trabalhos cuja beleza emociona os sentidos e proporciona um prazer espiritual e intelectual aos que se deleitam em apreciá-los.
Rua principal e Praça 19 de Dezembro
O município também dispõe de um artesanato de alta qualidade confeccionado em diversos materiais e em vários aspectos, como entalhe e escultura em madeira e concreto, em telas a óleo, em cipó, materiais plásticos e barro. Infelizmente essas produções artísticas não receberam ou não recebem a verdadeira valorização que deveriam nem são reconhecidas pela sociedade local que devido ao seu baixo índice de desenvolvimento humano e também em função da precariedade econômica não sabem o seu verdadeiro valor e importância que representa, sobretudo para a identificação de sua cultura, de suas origens e raízes pela sua autenticidade e pela preservação da cultura local.
A luta pela sobrevivência na região proporcionou ao homem desenvolver sua capacidade criativa, tornando-o sábio dentro do seu ambiente, mesmo com pouco ou nenhum aletramento a natureza os fez capazes de reproduzi-la e os dotou de profundo conhecimento a seu respeito – o da natureza – pois a ela estavam condicionados. Isso porque a complexidade da floresta lhes exigia grande conhecimento sobre seu ecossistema. Para viver em meio a essa complexidade ambiental foi necessário que fossem estabelecidas relações de interdependência entre o homem a e natureza que formavam as partes envolvidas no processo de sobrevivência da sociedade local. A luta pela vida é que fez o homem desenvolver meios alternativos para sobreviver, descobrir seus dotes artísticos, dando mais realce e autenticidade a sua cultura através de sua expressão artística.

4. 2 – FESTAS.
Em tempos ainda recentes, era comum a realização de festas populares folclóricas e religiosas por ocasião de datas comemorativas como as apresentadas a seguir:
- Festas Juninas (Santo Antonio, São João e São Pedro). Festejar essas datas sempre foi uma obrigação para a população. Por ocasião das Festas Juninas, toda a população da cidade e entorno se reuniam para juntos comemorarem, apresentar suas danças, comidas típicas, vestuário, artesanato, e outros elementos da cultura local. Grupos de dança folclórica, músicas trazidas pelos nordestinos e adaptadas à realidade local davam ritmo e alegria aos festejos. Mas, esse é um passado que ficou apenas na memória, não foram preservadas, as gerações posteriores ignoraram tal legado e, dessa forma, foi ficando cada vez mais remota a possibilidade de valorizar esse patrimônio e o despertar de um sentimento de amor e preservação da cultura de seus antepassados e de se identificar com o seu lugar de origem.
               
Praça 19 de Dezembro
           
        - Festa de 31 de Janeiro (aniversário da cidade de Envira). Data comemorativa do aniversário de fundação da sede do município festejada desde 1962. Iniciada na primeira gestão do primeiro prefeito constitucional, Francisco das Chagas Valle, as comemorações de 31 de janeiro continuam até os dias atuais. Vale ressaltar que no final do século XX e início do século XXI o evento ficou conhecido como Festa do Milho, pois nessa época o milho se tornou o produto de maior expressividade do município, tornando-se o carro–chefe dos produtos agrícolas da região, por isso a partir do ano 2000, aproximadamente, a tradicional Festa de 31 de Janeiro passou a ser conhecida como “Festa do Milho”. Por ocasião do evento eram feitos investimentos em abstrações, virtualizando a imagem da cidade para impressionar os visitantes, mostrando através de atos propagandísticos uma realidade fora do contexto da população local. A administração pública mantinha, durante alguns dias ou mantém, nas áreas de maior movimento da cidade uma estrutura que aparentava um aspecto de modernidade e desenvolvimento: higienização, produtos de boa qualidade, comércio, cultura, esporte e lazer e o agro negócio, além de outros efeitos impressionistas.
          Durante o percurso histórico do município de Envira o referido evento evoluiu bastante, atraindo cada vez mais participantes e curiosos, principalmente pela grandiosidade que ela representa para a expressão da cultura da local. O evento movimenta um considerável volume de recursos humanos e financeiros. É importante ressaltar que durante um determinado período, o que vai do final do século XX ao início do século XXI, a festa de aniversário da cidade de Envira foi usada e, aliás, sempre foi, para que seus organizadores vendessem uma imagem virtual da cidade para outras regiões do Amazonas e até do Brasil. Mas, o fato é que a festa apresenta uma multiplicidade de aspectos: culturais, econômicos, lendas, danças, folclore, musica, trajes e comidas típicas, esporte, arte, comércio, política, moda, estética e parte da expressão da cultura local e outros. Atrai uma multidão de pessoas do próprio município, de outros municípios vizinhos e de outros estados do Brasil. Aí são encontrados tudo que o município de Envira produz em termos culturais, políticos e econômicos. 
O evento de 31 de janeiro é uma festa tradicional e ao longo de sua história vem ganhando novos elementos culturais local e regional a cada ano. Dois eventos chamam a atenção durante as festividades: o FECANE (Festival da Canção Envirense) e o desfile para escolha da garota Miss Envira. A festa dura em média três dias. Há também exposição de arte, feira de produtos regionais e uma série de outros eventos que dão um espetáculo grandioso às festividades. A festa de 31 de janeiro se tornou também uma atração turística, pessoas de vários lugares visitam a cidade, participam e assistem aos vários eventos que ocorrem durante os dias 29, 30 e 31 do mês de janeiro.


TERRA ABENÇOADA POR DEUS

O aniversário de Envira é tradição,                               Nossa terra vale mais que ouro.
Festejamos com muita satisfação.                                 Vamos preservar suas belezas,

A paz resplandece sobre nós;                                                Pois, esse grande tesouro

Somos heróis e vivemos em união.                                É presente da Mãe-Matureza.

Aqui se respeita o meio ambiente.                                  Envira é um cenário artístico,

Envira não vive na pobreza.                                                    Que vive de prosperidade,

Tem seus recursos naturais                                              A sua festa é atração,
E a terra é nossa maior riqueza.                                       E contribui para o bem da cidade.

O milho tem destaque no Envira.                                     Letra e Música: João Luiz Silveira da
Temos ainda o arroz e o feijão.                                         Rocha.
Se plantarmos a semente na terra,
Jamais nos faltará o pão.

Refrão:


Terra abençoada por Deus

De onde o povo tira seu sustento,
Onde jorra água das fontes;
Não falta sol, nem chuva e nem vento.


- Comemorações religiosas. São várias as festividades religiosas realizadas no município, mas há duas que se estacam, pois atraem um número e fies bastante expressivo e são, tradicionalmente, comemorados desde a fundação da cidade, que são: a festa de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro (Padroeira do município) e a festa de São Francisco, comemorada em 04 de outubro. Ambas as festas atraem uma multidão de fies que movidos pela fé vem agradecer as bênçãos e graças recebidas ou rezar para obter sucesso na vida pessoal, saúde e bem estar social. A religião católica é predominante na população do município, a religiosidade é uma característica marcante na sociedade envirense, principalmente entre as pessoas mais idosas que mantém a tradição dos cânones da religião dos colonizadores.                                                                                                                                   


                           4.3 – FOLCLORE E LENDAS
O folclore do município é expressão da cultura nordestina trazidas pelos migrantes, adaptadas à região e acrescentadas aos estoques indígenas. A força dos mitos e histórias indígenas ajuda a compor um quadro folclórico característico do entrelaçamento das duas culturas que difere daquela da terra natal dos migrantes e da primitiva autenticidade nativa.
Os dois elementos se fundiram para dá uma expressão do folclore local, próprio do meio, característico do elemento típico – o caboclo – formador da sociedade do município no seu populário, expressão viva do cotidiano das gentes nas suas mais variadas atividades.
Arthur Reis fazendo referencia ao aspecto folclórico da região comenta o seguinte: “O folclore do seringueiro, como era natural, não se limitou, nem podia mesmo limitar-se a aceitar o que já era corrente ou lhe chegou de fora. Expressão viva da psicologia das coletividades, de sua capacidade criadora, enriqueceu-se com a matéria – prima da vida local, nas operações econômicas, nas atividades sociais, nas singularidades do meio” (1997, p. 272). Os motivos nordestinos na região estão mais presentes que a cultura indígena primária. A fusão das duas culturas resultou numa cultura característica da própria região que expressa o modo de vida das gentes e as atividades que realizam.
É evidente que as crenças, a criatividade, as atividades diárias, os mitos e a própria religiosidade presente na população é que são responsáveis pela formação dos pilares da organização folclórica da vida local, uma vez que, a região apresenta particularidades que diferem das de seus exploradores e nem podiam ser conjugadas nos seus aspectos único e particular com os elementos folclóricos tradicionais e característicos de lugares e/ou povos distintos.
A religiosidade deixou marcas profundas na população de gente simples, na sua maioria, que passaram a acreditar naquilo que não podiam explicar e que estava presente nos fatores sobre os mistérios da região e que interferiam na rotina dos afazeres locais. Não que a simplicidade das pessoas seja responsável pelo grau de obstacularização do processo de formação cultural ou por diminuir sua expressividade, muito pelo contrário, as gentes simples é que deram vitalidade e solidez às manifestações culturais do município, principalmente por meio do respeito às singularidades do meio.
“A fé era um meio de manter viva a esperança do povo em alcançar proteção contra os perigos da região e de obter saúde e realizar algum desejo através de promessas e devoção aos santos, assim como a participação aos eventos religiosos. Numa região abandonada à religiosidade era a única forma de buscar forças para esperar dias melhores” (Francisco E. Filho, entrevista concedida em 14/11/2004).
O trabalho catecúmeno realizado durante séculos pelos cânones da religião, deu a preparação de uma mentalidade que permitiu o despertar de uma religiosidade no imaginário popular: nas crenças, no folclore, nos mitos e nas lendas, como a lenda do Matintaperera, a do Mapingueri, a da Cobra Grande, do Boto, do Uirapuru, do Curupira e outras características da região foram incorporadas aos estoques nordestinos e tidos como elementos em curso corrente nas manifestações culturais do município. A lenda da Mandioca e do Milho também fazem parte do populário caboclo, aliás, as duas já foram apresentadas na festa de aniversário da cidade de Envira.
A religiosidade, aspecto marcante na sociedade do município, não foi uma conseqüência do surgimento da cidade. Envira, ao contrário de muitas cidades circunvizinhas, não se originou a parir de um núcleo religioso, como já frisamos anteriormente, mas o predomínio da Igreja Católica na região estabeleceu as bases da fé e do ideário religioso em curso nas unidades produtoras e nos núcleos urbanos que surgiram no meio da selva.
REIS, (1997, p. 156): “A obra de civilização que a Igreja Católica, pelas ordens religiosas vem realizando na Amazônia, há três séculos, não pode ser negada. É tão forte, tão viva, tão expressiva! Se das oitenta cidades com que conta a Amazônia, trinta são antigas fundações realizadas pelos religiosos”.
O exposto acima, escrito ainda na metade do século passado, nos dá uma idéia mais ampla sobre a influencia que a Igreja Católica teve na formação da sociedade em quase toda a Amazônia nos seus mais variados aspectos de vida do caboclo, regra que se aplica, de certa forma, também aos primeiros habitantes do município de Envira, pois quase todos vieram do Nordeste e lá a presença da Igreja Católica foi muito marcante na população.
A vida cultural de Envira expressa a origem do seu povo, num quadro complexo que engloba etnias, crenças, hábitos, costumes, mitos, lendas etc., como resultado de um passado de luta pela ocupação dos espaços rural e urbano, pelo desbravamento da imensidão verde, pela aquisição dos conhecimentos a partir da lida com o meio e repassados às gerações, enfim, a luta pela sobrevivência e pela adaptação ao meio o que viabilizou a abertura de novos caminhos para novas atividades e de maneiras de viver, ou sobreviver.